domingo, 12 de outubro de 2008

A vinda da estação chuvosa trouxe benesses ainda maiores que a simples umidade ao espírito (e ao trato respiratório) dos homens que vivem nestas terras. A chuva fecundou a terra de forma que dela brotaram inúmeros insetos voadores que gentilmente invadem nossas casas e mantém conosco amigável tertúlia, com a exceção ingrata dos mosquitos. Dentre essa gama de gentis monstros de pequenas proporções, destacam-se como bons companheiros dos homens os besouros.
Os besouros, se não são os melhores amigos dos homens, devem ter sido, durante muito tempo, o melhor entretenimento destes.
Como os outros insetos, os besouros se aproximam da luz. E, exatamente por ser a única criatura capaz de criar luz contínua em plena noite, o homem deve ter tido desde muito cedo a companhia destes e de outros insetos. De todos os insetos, os besouros são aqueles que fornecem melhor companhia ao homem: não picam, apesar de transmitirem doenças, e além disso, por serem frequentemente maiores que seus pares, proporcionam um benefício estético e criativo: imagino quantas e quantas noites ancestrais - nas quais não havia qualquer tipo de entretenimento exceto as conversas ao pé da fogueira - foram animadas por histórias e contos acerca desses pequenos artifícios multicolores e animados da natureza. Os besouros que se reuniam e ficavam virados com o ventre para cima em volta da fogueira ajudavam à criar um ambiente onírico que estimulava a imaginação das crianças; os velhos anciãos tratavam de explorar essa propriedade intrínseca à essa classe de animais criando e transmitindo uma série de narrativas sobre eles.
O fato é que um inseto qualquer representa uma possibilidade única: podemos neles enxergar um pedaço de nossos pesadelos ou sonhos, dada sua disparidade formal em relação aos mamíferos e demais animais de maior porte, ao mesmo tempo em que eles se mantém, devido ao seu pequeno tamanho, numa esfera onde não são capazes de causar pânico ou medo: os insetos se constituem numa legítima experiência onírica sobre controle. De fato, seria difícil contemplar a beleza terrível e eficiente de uma formiga se esta tivesse uns três metros de altura. Talvez esse contato ancestral tenha sido o responsável por introduzir os insetos no imaginário coletivo de grande parte da raça humana.
Acho uma experiência interessante observar esses seres, principalmente as abelhas, voando em direção à luz. Elas vão ávidas, batem na lâmpada, e continuam se apertando contra essa, como se quisessem quebrar o vidro que impede que elas se banhem na luz, que absorvam a luz. É claro que elas acabam se queimando, ou ficando tontas, e morrem. Mas às vezes eu tenho a sensação de que esse é o melhor jeito de morrer para uma abelha, porque parece que, por um instante, elas encontraram uma paz e um gozo batendo com a cabeça na lâmpada. Quase como uma certa classe de hominídeos. Mas isso é assunto pra outra postagem.

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