Na terça feira (09/02) a OAB nacional, na pessoa de seu presidente Ophir Cavalcante, fez um pedido formal à procuradoria geral da república pedindo a prisão preventiva ou o afastamento do governador José Roberto Arruda. Cavalcante declarou sobre Arruda que "Sua permanência no cargo poderá ensejar dano efetivo à instrução processual", ou seja, segundo o presidente da OAB, a permanência de Arruda como governador pode ser danosa às investigações dos esquemas de corrupção, conduzidas atualmente pela Polícia Federal em sua operação Caixa de Pandora.
Sob certa perspectiva, pode-se afirmar que Arruda já caiu. Expulso de seu partido, Arruda ficará pelo menos os próximos dois anos sem a possibilidade de ocupar qualquer cargo eletivo no Brasil. Mas não é isso que fundamenta a avaliação de sua queda. Ora, com pouco tempo restante de governo, e estando o GDF na ordem do dia da mídia e de órgãos de controle social como o Ministério Público Federal, Arruda está impossibilitado de perpetuar o real motivo de seu envolvimento com a política institucional, que é a acumulação de recursos para si e principalmente para os grupos empresariais que o apoiaram. Impossibilitado politicamente de começar novas obras ou de captar recursos externos (via BID, por exemplo), Arruda sofre também uma ação judicial impetrada na sexta feira (05) pela OAB nacional pedindo o bloqueio de seus bens e dos deputados distritais citados na Operação Caixa de Pandora, da PF.
Historicamente, os setores empresariais buscam controlar o Estado, o qual passa então a atuar no sentido de viabilizar as operações em grande escala que são necessárias para manter o ritmo acelerado da acumulação de recursos. Sob esse aspecto, Arruda está impossibilitado de cumprir sua função. Os setores do empresariado que financiaram sua eleição e o apoiaram estão neste momento procurando um novo arranjo sob o qual possam manter o controle sobre o governo distrital, a fim de continuar contando com seu indispensável apoio para a realização de uns tantos Noroestes (atualmente, o símbolo mais vistoso dessas relações) no Distrito Federal.
Onde fica Planaltina nesse momento? Qual a parte que lhe cabe nos intercâmbios de poder e de recursos mobilizados pela ação da política institucional? Repetindo aquilo que foi dito no primeiro parágrafo deste texto, a gestão de Arruda baseou-se na realização de grandes obras públicas. É através delas que Arruda garante o apoio dos setores da burguesia responsáveis por sua manutenção no poder. Basta lembrar que o vice-governador do DF, Paulo Octávio, é dono da maior imobiliária do Distrito Federal e mantém também grandes operações de incorporação e construção.
Por esse motivo, é possível demonstrar que, durante o governo Arruda, A região de Planaltina e as cidades próximas receberam um volume substancialmente maior de investimentos em obras de infra-estrutura, se comparado com o governo anterior, sob o 4º mandato de Joaquim Roriz (2003-2006). Um texto publicado em 28/03/2006 (portanto, ao fim do último governo de Roriz, encerrado em março daquele ano) no site da administração regional de Planaltina traz a seguinte passagem, sobre a instalação de uma rede esgoto no bairro Arapoanga: “Serão implantados 81 quilômetros de redes, ramais condominiais, interceptor e linha de recalque, com 6,6 mil ligações prediais, beneficiando cerca de 30 mil pessoas. Os investimentos serão de R$ 7,8 milhões.” Num texto sobre as obras em Planaltina realizados pela gestão Arruda, colhido da página do GDF e publicado em 14/09/2007, pode-se ler o seguinte: “A região de Planaltina, Mestre D´Armas, Vale do Amanhecer e Arapoanga receberá investimento de R$ 48,6 milhões para melhorias em infra-estrutura. Planaltina e o condomínio Mestre D’Armas terão mais de R$ 11 milhões em obras e serviços de infra-estrutura, esporte, lazer, saúde e educação.” A comparação é ilustrativa apenas da diferença de escala entre as operações realizadas pelas gestões de Roriz e Arruda.
Essa diferença de escala no volume investido em obras significa, em termos de capital político, uma mudança da percepção, pelo menos por parte da população, sobre a atenção dispensada a elas pelo poder institucional. Embora persistam em Planaltina, como em todo o DF, os grupos ligados à Roriz, estes se encontram bastante enfraquecidos diante da opinião pública em face do aumento do volume de recursos destinados à cidade. Roriz formou sua base de sustentação apoiando e fomentando ocupações ilegais de áreas públicas, que deram origem a verdadeiros “currais eleitorais” quadrilátero afora. Os beneficiários desse processo formam o grupo de apoio mais consistente do qual Roriz dispõe hoje. Quanto aos grupos de esquerda, sua capilarização em lugares como Planaltina é mínima. Basta constatar que, via de regra, no DF, os detentores de cargos eletivos ligados aos partidos percebidos como de esquerda têm sua base eleitoral principalmente entre a classe média, segmento presente, mas minoritário em Planaltina.
Portanto, é altamente compreensível que uma parte da população de Planaltina avalie sua relação com o poder institucional sob o paradigma do “rouba, mas faz”. A despeito de toda a corrupção e de todas as conseqüências nefastas da gestão Arruda, é difícil argumentar sobre corrupção, neoliberalismo, degradação ambiental e destruição do planejamento urbano, com populações que percebem uma melhora sensível em suas condições de vida, dado o aumento da quantidade de recursos disponíveis para obras de infra-estrutura, pelo menos neste primeiro momento.
Em verdade, seria necessário escrever todo um volume para listar os malefícios trazidos ao Distrito Federal e à Planaltina sob a égide do governo Arruda e de seu modelo privatizante e explorador. Em longo prazo, a manutenção deste modelo de gestão tem potencial quase ilimitado para degradar as condições de vida da maioria da população e para submetê-las ainda mais ao julgo da concentração de renda e da exploração pelo capital, que é a finalidade última dos governos neoliberais, e é também a forma através da qual eles mantêm as zonas periféricas das cidades e seus moradores submissos.
O pensamento de uma parcela significativa da população de Planaltina entretanto parece passar longe dessas questões. Um expoente dessa linha de pensamento pode ser encontrado no jornal Recado News, que abrange a região da chamada saída norte (Sobradinho, Planaltina, Planaltina de Goiás, entre outras localidades). O editorial da edição de janeiro de 2010 (nº 170) tem por título “O entorno sofre com Brasília” e traz, em síntese, um ponto de vista segundo o qual o escândalo de corrupção estaria a impedir as melhorias conduzidas por Arruda na saída norte de continuarem, escândalo esse fomentado pela mídia e pelos grupos políticos de oposição ao governo, tendo em vista fins eleitorais, de forma injusta e indevida. Eis o trecho final do supracitado editorial: “Será que, depois do revés, as mudanças apontadas e já iniciadas continuarão ou o Entorno será, mais uma vez, vítima inocente de um fatídico esquema do qual (sic) nada tem a ver. Entorno sofre com Brasília.”
Sobre esse veículo de comunicação é preciso pontuar algumas coisas. Em primeiro lugar, trata-se de um jornal cujo apoio ao governador Arruda é explícito. Nesta mesma edição, foi publicada uma página inteira (página 8) contendo uma carta redigida pelo governador sobre o escândalo de corrupção. Congruentemente, trata-se de um veículo francamente conservador. No mesmo número há uma matéria exaltando o movimento de expulsão de uma zona de prostituição de Planaltina por igrejas protestantes (“Marechal agora é ‘rua das igrejas’”, página 10), no qual os templos são descritos como “a parte boa da sociedade”. Seria portanto inverídico supor que maioria da população de Planaltina concorde totalmente com opiniões tão retrógradas e marcadas a favor de Arruda. Duas das fontes ouvidas confirmam episódios de vaias públicas, por parte da população de Planaltina, a deputados distritais oriundos da cidade e envolvidos com o esquema de corrupção investigado pela Polícia Federal.
Por outro lado, conversas casuais com populares na cidade revelam que o ponto central do editorial do Recado News parece ser quase consensual, principalmente entre os moradores das áreas menos atendidas por equipamentos urbanos. A população se ressente de uma possível interrupção das obras de infra-estrutura. Douglas Alves, 18 anos, vendedor ambulante em uma barraca próxima à rodoviária de Planaltina, não se declarou favorável ao governador Arruda, mas expôs o seguinte em uma conversa informal: “É fácil pra vocês playboyzinho, que mora no plano, querer tirar o cara, mas ele colocou escola, melhorou o esgoto lá onde eu moro [no bairro Arapoanga]. Sem isso, como é que eu fico?”
segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010
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